Porque há vida para além da paisagem... para além da rotina diária, do mundo das notícias e do ecrã. Reflexões daqui, dali de acolá ... e de cá de dentro, que é onde a nossa paisagem se molda e gera paz.

sexta-feira, 29 de maio de 2015

O vestido de Joana e Maria - Conta lá tu o fim



(Nota: Desafio de A Limonada da Vidal aceite por Para além da paisagem para dar um fim a esta história)


No seu quarto Joana angustiava,
 – como é possível? Ainda há 2 semanas experimentei o vestido e estava tudo bem! Isto tem de resultar, vou experimentar o corpete que o Francisco me ofereceu no dia dos namorados. Se eu apertar estas banhas o vestido servirá na certa! Oh não! O fecho não passa daqui e o casamento é daqui a duas horas. Mãe! Mãe, anda cá, por favor! Preciso da tua ajuda. O vestido não me serve. Maldita dieta do limão!
(chega a mãe)
 - Então, ainda não te maquilhaste?
- Mãe, por favor, não me pressiones mais ainda! Preciso de caber dentro deste vestido, dê por onde der! Liga à tua costureira Maria, e ela que venha cá em dois passos.
(chega a costureira)
- Ó menina Joana, isto não tem solução, eu não tenho tecido para lhe fazer o acrescento. Essa barriga está enorme, o fecho não passa da cintura. Tem a certeza de que não estará grávida?".

(Um , dois, três, agora escrevi eu:)

“Não, não podia ser” – pensava Joana. Decerto que, se dissesse às pessoas naquele quarto,  que tinha feito um voto de castidade até ao casamento, ninguém entenderia. Até Francisco, quando ela lho sugeriu, franziu o sobrolho. Mas ele entendeu, e até se animou com a ideia, enfim, dizendo que assim teriam tempo para se preparar, para se entregarem por completo um ao outro.
Mas Joana não tinha sido fiel. A si mesma, sobretudo. Os pensamentos pecaminosos assolavam-lhe as noites quentes, em que não conseguia dormir. Pensava naquele homem alto, cabelo desalinhado, suor a escorrer do rosto enquanto desbravava minis no café da esquina. Olhava-a quando passava apressada com os preparativos do seu casamento. Ela sentia-se observada…e adorava! À noite, pensava nas suas mãos calejadas e como seria senti-las a percorrer cada centímetro do seu corpo, ávido de prazer.
Para afastar esses pensamentos, Joana abria todos os dias a última gaveta da sua mesa-de-cabeceira e retirava barras de chocolate que devorava como quem devora um comprimido, esperando que faça efeito rápido. Para que a sua mente se acalmasse.
“Teria sido isto que me fez engordar em duas semanas?” – pensou.
“Saiam todas… Deixem-me sozinha, vou caber nesse vestido mas deixem-me tentar sozinha!”
A mãe respeitou, mesmo sem entender. Maria também saiu e foi-se embora, fechando a porta da rua calmamente atrás de si. Suspirou e sentiu-se aliviada. Com certeza que Joana não caberia no vestido. Os dois centímetros que retirara propositadamente ao vestido não o permitiriam. Assim, Maria poderia afagar o cabelo de Francisco mais uma noite. Mais uma noite de castidade em que Francisco se preparava para o casamento com Joana, enrolado nos lençóis de Maria. Duplamente se sentia Maria aliviada, pensando: “ Bem feita, ninguém te mandou invejar o meu homem, quando ele está no café a beber as suas cervejas e te olha de cima abaixo….”

No quarto, Joana desistia. De tudo. Abriu a gaveta e comeu o último chocolate.

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